18 de nov. de 2010

João-de-barro

O piso ladrilhado brilhava. A aparência da capela transparecia um sentimento de paz que conquistava cada coração que lá se fazia presente. Eram pouco mais de 14h quando o canto do joão-de-barro ecoou de novo. Eu o vi e suponho ter entendido seus desígnios aquela tarde. Após uma semana acompanhando o sofrimento de mamãe no hospital ele viera se despedir. Isso se não estava ali cantarolando em sinal de chamado. Quem sabe.

Além de exímio cantor, o pequeno pássaro é também um arquiteto e tanto. Trabalhador incansável. Prefiro imaginar que ele laborou ininterruptamente durante os seis dias que mamãe permaneceu hospitalizada na construção de sua morada no pós vida. Imagino, claro, o ideal de paz para ela. O melhor depois de tanta angústia. O melhor. Tal qual fizera o pequeno Matheus.

O desenho de garotinho de seis anos e filho de minha prima Emanuella é a síntese daquilo que sentíamos. E a mim ninguém convence que o desenho seja uma representação do último transporte usado por mamãe. Pois o bondinho externado no papel é isso. E não cabe a razão, muito menos a emoção, desconsiderar o que a criança disse. O significado daqueles traços.

2009 vai ficar eternamente registrado como o ano que mamãe viajou com este bondinho por céus e terra, até seu destino final. Teve como companhia a paz e serenidade dos coqueiros de uma praia. E claro do joão-de-barro que nunca deixou de cantar. Fez sua última viagem na melhor companhia, pois cumpriu com sua missão entre os vivos. Aposto que está em um lugar muito melhor e menos tumultuado. Feliz o joão-de-barro e feliz os que tem a sorte de andar no bondinho. Pois, dizem: seu condutor é o próprio Deus.


***

Encontrei este texto após rápida varredura em arquivos antigos no meu notebook. Infelizmente não tive a mesma sorte em relação ao desenho. Achei que seria válido publicar o texto, afinal, as saudades são eternas, 1 ano e 8 meses depois.


2 comentários:

Tiago Medina disse...

Bah,
muito bom bonito e bem construído, esse texto. Nostalgia boa e pura.

Abraço

Evelyn Bastos disse...

Lindo o texto!! Parabéns... é incrível como nos surpreendemos com coisas tão simples e fazemos delas algo tão especial somente com as palavras... vasculha mais! vasculha mais! Hehehe

Beijocas!