22 de abr. de 2011

Quero parar de roer as unhas


A ponta do dedo indicador da mão direita dói. Roí tanto a unha que consegui machucar a carne. Está vermelho, inchado e febril meu pobre dedo. Chove. A água que despenca dos céus, em contato com o zinco do puxadinho do 101 faz barulho. Tenho jornais, revistas e livros a minha volta. Leituras inacabadas. Minha mesa está um caos. Na tela do computador páginas e mais páginas abertas de sites, portais, blogs. Twitter, facebook e outros.

Informação, informação, informação. Rapidez. Velocidade. Chego a conclusão que não “pertenço” a esse mundo. Levo as mãos à cabeça. Por mais que tente não consigo assimilar tudo que se passa. Não sei o que é novidade, o que não é. Os jornais parecem todos velhos, embora tenham cheiro de novo. De banca. As revistas inventam. São folheadas. Abandonadas. Talvez tenham mais sorte em um consultório de dentista. Devo ter ficado aprisionado em algum lugar entre o meio e o final da década de 1990, talvez nos oitenta.

Temo pelo futuro. Será que a tecnologia que atropela e empurra tudo para dentro de netbooks, iPhones, iPads, tablets e etecetera e etecetera, será acessível a um número razoável de pessoas, ou muitos verão a banda passar, chupando o dedo sem saber o que é usar um iPad ou ver televisão com qualidade e programação adequada a digitalização?

Talvez a pergunta que tenha de se fazer seja outra, afinal, ter acesso não é sinônimo de saber manusear e usufruir de todas essas benesses. No entanto, será que alguém se importa com isso? Eu, particularmente, duvido muito.

Vender é o que se quer. A todo custo. Quanto mais, melhor. A tendência, triste mais real, é que tudo se torne descartável. Computadores, celulares, sapatos, músicas. O barato não é trocar o vídeo cassete por um leitor de DVD. Eu paguei caro e em seis parceiras o meu e hoje se fala e se vende filmes, shows e tudo o mais em blu-ray. Amanhã, provável que esta tecnologia seja substituída por outra com vida útil ainda menor.

O barato é publicar fotos em tempo real onde quer que se esteja nas redes de relacionamento na internet. É viver quase que em função exclusiva de um celular. É ter a capacidade de exercer o maior número de tarefas, ainda que de forma não mais que razoável, no menor espaço de tempo possível. O barato é viver superficialmente. Começar e talvez não terminar. Compartilhar. Curtir.

Tudo que quero é meu velho toca discos de volta. Sentir o chiado da agulha no vinil. Desligar as luzes e esquecer da vida com o 2112 do Rush. Não quero ficar enrustido em fones de ouvido acoplados em malditos celulares sensíveis ao toque. Quero receber cartas. Escritas a mão. Quero saber como é a caligrafia do meu amor. O jeito que as letras são formadas, desenhadas. Quero Cartões de Natal. De Aniversário. Quero a beira do mar. O barulho das ondas. O sossego. A paz. Tirar o pé do acelerador.

Parar de roer unha. Sim. Parar de roer unha. Meu dedo ainda dói.


19 de abr. de 2011

Salvo pelo bebezinho




Há quem defenda a tese de que um relacionamento precise de umas ‘briguinhas’ às vezes. Questão de sobrevivência. Para não cair no marasmo. No ostracismo. Pequenas discussões e desentendimentos fazem parte do jogo, do convívio. Da necessidade de se reconquistar a pessoa amada constantemente. Reforçar a confiança e etecetera e tal. 

Eram 19h. Domingo. A praça de alimentação do shopping se não estava lotada mantinha um fluxo de pessoas indo e vindo, e sentando e levantado, e comendo e bebendo. O chopp a minha frente não estava gelado, mas era um chopp, ora bolas. Podia não estar cremosinho como deviam ser todos os bons chopps deste mundo, mas ainda assim, satisfazia minha felicidade. Bebericava e resvalava a língua para limpar o bigodinho feito com a espuma branca do líquido abençoado. 

- Hummm. 

A minha esquerda uma jovem, não mais que 19 anos senta. Cara fechada. Braços cruzados. Poucos instantes depois um jovem, arrisco 21, passa apressado pela mesa onde eu e meu irmão bebíamos nossos chopps felizes. Carregava um casaco jeans e um livro. Muitas páginas, muito mais que 400. Não consegui identificar o título, apenas que se tratava de “história”, no sentido crasso da palavra. Sentou ao lado dela a espera do pedido. Estavam distantes. Ela irredutível. Cara fechada e braços cruzados

Meu chopp chegou a metade quando o pedido do casalzinho foi entregue. Ele começou a comer. Conversavam. Não ouvia chongas do que falavam mas conversavam. Discutiam. Ele parou de comer. Abandonou pela metade o salgado que comia e também cruzou os braços. Virou o rosto. Ela falava. Como falava. Falou tanto que ele juntou casaco, o livro e levantou. Ameaçou ir embora. Deixa-la para trás. 

Rápida e com sangue nos olhos a garota o segurou pelo braço. Com força. Ele voltou a sentar. Repetiu-se o roteiro. Braços cruzados, rosto virado, olhar distante. O sermão da jovem continuou. Meu chopp acabou. Pedi outro. Ri. Brindei com meu irmão, a essa altura mais interessado em saber o desfecho da briga ao lado que qualquer outra coisa a nossa volta. 

Ele voltou a se levantar. Ela mais uma vez o segurou pelo braço. O jovem mudou de estratégia. Tentou se aproximar. Recostou-se no ombro dela. Tentou um beijo apaziguador nas bochechas rosadinhas e lisas. Nada. Ela não queria saber de beijinhos e abracinhos. Naquele momento ela queria discutir a relação. Alguma coisa de muito grave, para ela, o namorado tinha feito e não podia ficar sem que ambos chegassem a um consenso. 

Era evidente. Ela queria atenção, ele não queria conversa, achava que ela estava exagerando ou, na pior das hipóteses, que aquele não era lugar para uma briga ou para resolver o “grave” problema. 

Aliás, ele não achava aquele um problema. Para ele não havia razão para uma discussão, principalmente em um local público e sob os olhares famintos de dezenas de estranhos, inclusive eu e meu chopp não muito gelado, mas ainda assim um chopp

Os homens não gostam de discutir relação. As mulheres sim. As mulheres querem atenção dobrada, talvez triplicada. Era o que a jovem de 19 aninhos queria. Atenção. Tanto foi que percebendo que sua tática não estava dando certo, ela resolveu se levantar e ir embora. Ele ficou sentado. Quase não se moveu. Apenas olhou para ela, levantou os braços e disse: 

- Não vá. Senta ai

Ela não queria ir. Levantou e ameaçou ir embora a espera de uma atitude do namorado. Queria, muito provavelmente, que ele se levantasse, a pegasse entre os braços. Queria ser domada. Não foi o que aconteceu. Ele apenas pediu para ela se sentar. E ela fez. Continuaram ali por mais alguns minutos. Braço cruzado pra cá, braço cruzado pra lá. Quando resolveram ir embora, saíram de mãos dadas. Até que o momento em que ele tentou cruzar o braço esquerdo por sobre os ombros dela. 

Pelo que aconteceu em sequência, aquilo foi um erro. Possivelmente ele tenha dito alguma coisa que não devia naquele momento ou tentado mordiscar a orelhinha dela. Não se faz isso em meio a uma briga. Mulher nenhuma quer ter a orelha mordiscada quando está xingando e reclamando e pedindo aos céus por atenção. Rapidamente, ela se desvencilhou do braço esquerdo do namorado e apertou o passo. Quase correu. Ele levantou os braços, como se pensasse: 

- Era só o que me faltava

Balançou a cabeça e seguiu, tentando encontrar a namorada fujona no meio de tanta gente. Foi interrompido por um bebezinho recém caminhante que trombou em suas pernas. Deu atenção ao bebê. Até brincou com ele. Trocou sorrisos com os pais do bebezinho e só então voltou o olhar a frente à procura da namorada. Ela estava de volta. Parada quase em frente dele. Novamente havia desistido de fugir. Trocaram um abraço um beijo. Ela sorriu. Deram-se as mãos e seguiram suas vidas. Acho que foi o bebezinho. 

O namorado foi salvo pelo bebezinho.




14 de abr. de 2011

Vexame em azul, preto e branco

Atuação deplorável do Grêmio na Bolívia e humilhantes 3 a 0 na conta.
Foto: Aizar Raldes / AFP / CP
Já disse em outras oportunidades que não me apetece escrever sobre futebol. O tema é deveras passional. Mexe com sentimentos que transcendem a racionalidade e faz, muitas vezes, com que o ser humano regrida e tome atitudes imbecis. Embora tenha escolhido graduar-me em jornalismo, prefiro não discorrer sobre o tema. Opção pessoal. Já arrisquei algumas observações. Aqui e ali e acolá mas, em geral, a exceção de algumas digressões sobre meu time do coração, prefiro o silêncio.

A jornada do Grêmio na noite passada na Bolívia foi desastrosa. Uma das piores atuações do tricolor em anos. O que assusta, no entanto, é que alguns erros cometidos à exaustão na partida frente o fraquíssimo Oriente Petrolero vem se repetindo ao longo do ano. A mais alarmante é a falta de finalização de média distância. O Grêmio não chuta em gol. Existem momentos no decorrer das partidas que a impressão é que há uma proibição por parte da comissão técnica: “Vocês estão proibidos de chutar em gol”. Talvez haja alguma punição para quem ousar infringir tal determinação durante as partidas. Tenho sérias suspeitas quanto a isso.

No geral, passado o baque pela goleada sofrida em Santa Cruz de La Sierra. O Grêmio é um time que não inspira confiança no seu torcedor. Chega a ser aterrorizante. Troca-se passes de um lado para outro, sem objetividade alguma.  Afunilam-se as jogadas com uma previsibilidade de dar dó. Há um camisa 9 que não faz jus ao posto de centroavante. Está sempre mal posicionado. Não sabe fazer o pivô com os jogadores que vem detrás. Erra um gol atrás do outro e pior, não sabe jogar de outra maneira. E para deixar as coisas ainda mais preocupantes, não tem um companheiro no ataque. Hoje, aposta-se todas as fichas no Olímpico em um garoto de 17 anos. Se este não der certo, acabou-se a folia. O sonho. A esperança. O argentino é esforçado, mas “pisar” em bola é demais.

Há quem tente explicar a tragédia anunciada. Transbordam justificativas para o futebol tenebroso praticado pelo Grêmio. “Não deu nada certo”, disse o presidente. “Foi uma jornada desastrosa”, declarou o dirigente de futebol. O, porém, é que o time repete as mesmas deficiências jogo após jogo. O sistema defensivo comete falhas imperdoáveis, embora sejam jogadores profissionais e recebam altos salários para dar uma resposta, no mínimo, menos vexatória. Não praticam o futebol em campos de chão batido ou somente nos fins de semana com os colegas de trabalho. Não. Estes cabeças de bagre que hoje vestem a camisa do tricolor vivem EXCLUSIVAMENTE para isso. Treinam todos os dias. Como pode, então, baterem tanta cabeça como batem? Bola na área tricolor é meio gol. Também não há definição na lateral esquerda do Grêmio. O episódio envolvendo o preferido do treinador em Caxias, duas semanas atrás, é motivo para demissão por justa causa. 

Inadmissível. 

Perder como se perdeu na Bolívia e na serra gaúcha contra o Juventude é vergonhoso. Uma piada pronta, como dizem os torcedores do rival. O pior é que estão certos os colorados. O Grêmio não se ajuda. Não tem sequência. O Grêmio não tem alternativa para os momentos de adversidade ou de pouca inspiração técnica. É dependente de um ou dois, que nem sempre jogam. Às vezes até entram em campo, mas com tanta má vontade que o time parece estar com um a menos em campo. O que assisti na noite passada me preocupou por demais. A propósito,  não pode haver torcedor do Grêmio que consiga acreditar que este time possa se sagrar TRI da América. Aliás, acho que esta conquista, se já não foi, está indo pelo ralo. Como todo respeito, mas não vou me assustar se amanhã ou depois Celso Roth não for anunciado como novo treinador.



10 de abr. de 2011

"Merda" vende

Imagem: culturamix.com 

A afirmação explícita no título desse post não é tão somente parte de uma simples opinião pessoal, como podem sugerir alguns. Em se tratando de gosto não há e nunca haverá unanimidade. Além do mais, embora suscite extremo mau gosto, há quem possa gostar de consumir “merda”, no sentido literal da palavra, e ai, não há o que – nem como se – contestar.

Também não é intenção apontar o dedo para o que é ou não “merda”. Consumir produtos desprovidos de qualidade não se restringe a uma minoria. De modo geral, consome-se merda a todo instante e todo momento. Há coisas ruins circulando e fazendo a cabeça das pessoas em todos os segmentos.

No âmbito da comunicação, infelizmente, as “merdas” produzidas parecem exercer um efeito de atração ainda mais impactante. Pena que esses produtos não cheiram como os dejetos marrons que expelimos após a digestão. Talvez ai o consumo destas porcarias fosse menor.

As emissoras de televisão são campeãs em ofertar “merda” para o público. Programas sensacionalistas que apelam para a exposição pública gratuita infestam a programação da tevê aberta. Os domingos são a prova cabal de como é possível fazer com que “merda” venda. Justificar o consumo pela falta de opção no zapping do controle remoto é o mesmo que pisar nos restos de um cavalo acometido por um infernal desarranjo intestinal.

Podem-se evitar estas porcarias. Existem saídas. O que falta é boa vontade. Imaginação. Interesse. O ser humano é subserviente ao que lhe é oferecido pelos meios de comunicação. E não apenas a televisão. Jornais, revistas, até a internet. Embora passemos por uma transformação aguda no processo, onde emissão e recepção se confundem e a liberdade de produzir e oferecer conteúdo para uma quantidade maior de pessoas cresce assustadoramente, ainda assim, o consumo de porcarias não diminui.

Pelo contrário.

Quanto mais gente produz, mas “merda” é consumida. Há uma agitação generalizada. Todos querem fazer parte do processo, mas poucos entendem ou tem condições para fazer algo bem feito. Uma meia dúzia dita as regras. Uma centena baixa a crista e outras milhares fazem arruaça. O que ninguém se dá conta ou finge não ligar é que embora não exista escancaradamente uma merchandising oficial, “merda” vende e continuará vendendo.

Somos felizes consumidores de “merda”, essa é a verdade.



5 de abr. de 2011

Elas querem independência

As mulheres tem preferido a companhia dos felinos. Foto: Anton Roos


As mulheres estão aprendendo a não depender mais dos homens. Boa parte delas já não quer mais se enrabichar, juntar os trapos e viver ao lado de um. Querem independência e o direito de ir e vir quando bem entenderem.

No mercadinho em que todas as manhãs compro o pão, o presunto de peito de peru e o iogurte de morango, as atendentes conversavam ao natural, como se eu não estivesse do outro lado do balcão esperando meu pedido.

- Ah, eu estou a quatro anos morando sozinha e não quero homem nenhum por perto – disse uma delas, enquanto colocava os pães na sacola.

- Quatro anos? Mas tu não sente falta? – indagou a outra.

- Não. Estou muito bem assim. Chego a hora que bem entender e não preciso dar satisfação a ninguém – desabafou a convicta solteira.

Atenta a tarefa de colocar um pão após outro na sacola, ela não se deu conta da minha presença e exclamou:

- Homem é tudo igual.

Quando percebeu era tarde. Levou as mãos à boca e de imediato, teve as bochechas tomadas pela vermelhidão.

- Desculpe – disse tentando se justificar. – Não tinha reparado no senhor – continuou a essa altura absolutamente encabulada.

Rindo e pensando somente nos pães morninhos que ela havia me servido, retruquei como se nada tivesse acontecido.

- Faça de conta que não estive aqui e que não ouvi o seu desabafo – respondi, já me dirigindo até a prateleira dos derivados de leite para pegar minha garrafinha diária de iogurte de morango, afinal, o que ela disse não foi nenhuma novidade.

O pior mesmo foi constatar que o iogurte de morango que me abastece todas as manhãs estava em falta.


4 de abr. de 2011

Mulher-Maravilha

Suspeitei no olhar. Alguma coisa havia de diferente naquela mulher. Não podia ser uma simples filha de Eva. Olhando daquele jeito, definitivamente, não podia. Era uma mulher especial. Diferente. Embora no fundo eu soubesse, de início dei pouca importância a minha suspeita.

Era o olhar que me tirava do sério. Nunca tinha visto uma mulher com um olhar daqueles. Hipnotizante. Uma flechada invisível e certeira.

Ela falava pouco. Fazia o tipo observadora. Não caminhava. Desfilava. Um charme. Eu, bobo, Não parava de pensar.

Quem era ela afinal?

Os longos cabelos negros, o olhar, o jeito de se comportar. Fechei os olhos. O que vi ou imaginei ou sei lá o quê foi tal qual uma revelação. Entre tantas mulheres vestidas como a heroína dos quadrinhos, eu estava diante da verdadeira. Só podia ser. A verdadeira mulher maravilha estava comigo. Sem os trajes característicos, ou os braceletes, ou o laço e sem poder usar seus super poderes. Mas, era a mulher maravilha. Só podia ser a Mulher-Maravilha. Quem mais. Eu tinha descoberto a identidade secreta da Mulher-Maravilha.

Quando ela voltou, tentei conversar sobre a revelação.

- Eu sei quem você é.

- Quê?

- Sim, eu sei. Você é a Mulher-Maravilha. A verdadeira Mulher-Maravilha. Não precisa esconder isso de mim.

- Mulher o quê?

- Mulher-Maravilha. Você.

- Hmm..ai ai...só você mesmo.

Nesse instante, os olhos castanhos escuros [N.E: devia estar usando uma lente ou algum poder especial já que a dos quadrinhos tinha os olhos azuis] quase me fizeram congelar. Ela riu. Beijou-me os lábios encostou o rosto no meu peito e continuou sorrindo.

- Seu bobo. Adoro seu jeitinho.

Ainda assim mantinha a certeza. Era ela. De mãos dadas e caminhando pela avenida quase deserta eu ria e tentava controlar minha vontade de gritar para todos ouvirem.

- Eu estou com a Mulher-Maravilha, não é o máximo.

Rindo ela me pediu para não fazer escândalo. Falou com maciez

- Não consigo imaginar onde é que você tirou essa ideia de Mulher-Maravilha.

Continuamos o percurso. Eu estava escandalosamente obcecado com a minha revelação e a ideia e estar diante da verdadeira mulher maravilha. Quando a beijei pela última vez naquela noite, observei-a um pouco mais. Ela olhou para trás e riu. Eu acenei, coloquei mãos no bolso e recriminei o fato de nunca ter sido fã de histórias em quadrinhos.



3 de abr. de 2011

Talvez


O cursor pisca vagarosamente na tela em branco. De novo. É a terceira vez essa semana. Apagão. Mãos a cabeça. Concluo: 

- Falta inspiração para escrever. O texto não está fluindo. 

Saio. Desço os quatro lances de escada. Olho para rua em aclive. Subo, depois desço. Redenção. Caminho. Canso. Volto. Subo os quatro lances de escada. Respiro. Estou cansado. Constato, ofegante: 

- Estou fora de forma. 

Volto para o computador. O cursor piscando me irrita. Coloco água no fogo. Vou ao banheiro. Xixi. Descarga. Lavo as mãos. Volto para a cozinha. Preparo um café. Bebo uma generosa xícara. Pouco açúcar. O aroma talvez ajude a escrever, espero.

Penso. Uma, duas, três. Demais. O tempo passa e nada. 

A tela continua em branco. Ideias. Desespero. Abro as janelas. Do quarto. Ar fresco. Da internet. Distração. Nada que ajude. As ideias continuam vagas. Passeiam com sofreguidão. Nenhuma agrada. Penso:

- Vou desistir. Quem sabe na quarta vez, tenha mais sorte com as letras. 

O cursor, por fim, continua piscando, tão vagarosamente como antes. Decido. Aperto o botão. Desligo. Off. Cato um livro. Folheio. Penso. Preciso me concentrar. Leio. Cochilo. Fica pra próxima. Talvez na quarta tentativa o cursor deixe de piscar na tela em branco. Talvez.