22 de dez. de 2010

Gabriel acredita em Papai Noel


Gabriel tem só 4 anos. Ainda toma mamadeira antes de dormir e quando acorda pela manhã gosta dela morninha. Não pode ser muito quente, nem muito fria. Como toda criança dessa idade, começa o dia assistindo desenhos animados. Só depois que vai brincar com seus carrinhos ou com sua bola de futebol. Chorominga a noite como forma de pedir carinho e atenção para mãePerdeu o pai faz pouco e é possível que não vá recordar suas feições quando chegar à adolescência.

Gabriel não foi programado. Foi um acidente. Nem o pai, nem a mãe previram sua chegada. Eram jovens, cheios de aspirações para o futuro, e claro, muito amor para compartilhar, tanto, que geraram Gabriel. Tiveram de aprender a conviver com o preconceito e a árdua missão de educar o filho pequeno. Não se casaram de papel passado. Optaram por conviver no mesmo lar de forma não oficial. Foram felizes por um tempo, os três: papai, mamãe e Gabriel.

Todavia, as brigas e discussões se tornaram freqüentes. A paixão descabida dos primeiros tempos foi murchando. Evaporou. Os sonhos já não eram os mesmos. Entre as diferenças do pai e da mãe estava Gabriel, dando seus primeiros passos e palavras. O menino deixou as fraldas, ganhou tios e tias e viu sua mãe lhe apresentar muitos dos amigos dela. Alguns dormiam na mesma cama que ela. Gabriel não entendia. Porque é que o pai não estava lá com a mãe e sim aquele outro tio que ele nem conhecia direito?

Papai e mamãe passaram a brigar com frequência. A separação foi inevitável. Gabriel passou a entender menos ainda o que se passava. Foi cúmplice de discussões e agressões. Chorou, incapaz de impedir que seus pais trocassem farpas diante de seus pequenos olhos. Aprendeu sem mesmo ter aprendido a conjugar o verbo sonhar, que isso não era pra ele. Seu mundo não lhe dava oportunidades para tal. Mesmo que sonhasse pouco, ter seu pai e sua mãe juntos e felizes com ele, aprendeu na marra que sua vida se encaminhava para um caminho chato e que não condizia com os momentos felizes que tinha enquanto brincava com os amiguinhos na creche, jogava futebol, tomava sua mamadeira morninha, sua mãe ia lhe buscar na escolinha, ou passava o final de semana com o vovô e a vovó. Nada disso.

Sem entender o mundo que o cercava, Gabriel perdeu o pai. Disseram para ele que o pai não voltaria. Disseram que o pai havia se enforcado. Tirado a própria vida. Mas porque o pai faria isso, se ele o amava tanto e queria que ele estivesse ao seu lado para lhe dar dicas sobre as garotas quando chegasse a hora? Os sonhos de Gabriel esvaíram-se. Teve de reconhecer na mãe a figura de um ídolo. Alguém que preza por ele mais que tudo e por quem ele deve total consideração, amor e respeito. Mesmo assim, Gabriel tornara-se um menino sem fantasia.

Não acreditava em Papai Noel e não entendia porque todo mundo ao seu redor insistia nessa história tola. Via a cidade se enfeitar, dezenas de velhinhos barbudos e com roupas vermelhas pelas ruas, presentes e mais presentes. Nada desse sonho encantado lhe dizia respeito. Entretanto, Gabriel teve uma revelação. Em um das muitos jantares que presenciara ao lado da mãe em sua casa, viu algo que lhe intrigou. No meio dos convidados da mamãe, um deles, embora não usasse as indumentárias vermelhas do Papai Noel se assemelhava e muito com aquele cara. Ele sabia que a barba do papai noel era feita de algodão. A daquele cara que ele observava com o canto do olho era real. Não podia ser. Será que Gabriel estava diante do verdadeiro Papai Noel?

Não resistiu a tentação e perguntou a mãe: Mãe, quem é aquele tio ali. A mãe, sem pestanejar, respondeu: Gabi, aquele tio trabalha com o papai noel. Gabriel se espantou. Os olhos brilharam. Um sorriso quis escapar do seu rosto. Mas restava a dúvida. Será mesmo que aquele cara barbudo conhecia o verdadeiro papai noel. Era sua chance. Precisava tomar coragem e falar com ele. Tinha vergonha. Procurava uma oportunidade de se aproximar. Sua mãe percebendo a inquietação do filho, o instigou a ir até ele.

Acho que tá explicado o porque de Gabriel ter ficado cismado
- Vai filho, pergunta pra ele. Pergunta se ele não trabalha com o papai noel. E lá foi Gabriel. Coração em disparada, correu e estancou diante do homem a sua frente e perguntou: - É verdade que você trabalha com o papai noel? O susto mudou de lugar. Quando vi aquele garotinho e percebi o brilho nos seus olhos, não titubiei e respondi que não só trabalhava com o papai noel, como o conhecia e que era seu amigo. O rosto daquele menino se iluminou. Um riso alto tomou conta do lugar. Gabriel correu para os braços da mãe para contar a novidade. O sonho voltara aquele pequeno coração. Gabriel acreditava em papai noel.



***

PS: O texto acima foi escrito faz algum tempo, mas, tendo em vista a proximidade de mais um Natal, vem a calhar

Nenhum comentário: