Na Roma antiga a política do “pão e circo” consistia em dar ao povo alimento e diversão a fim de evitar possíveis revoltas provindas das camadas mais pobres. A escravidão, àquela época, forçou a população das zonas rurais a migrar para a metrópole em busca de melhores condições para sua sobrevivência. O inchaço populacional teve como consequência imediata o desemprego. Era a deixa para o imperador instaurar o “panis at circenses”.
Quase todas as noites os estádios ficavam abarrotados de pessoas para assistir as sangrentas batalhas entre os gladiadores, além de terem a oportunidade de se empanturrarem com comida. Deste modo o Estado mantinha a plebe afastada da política e das questões sociais. Com isso o povo era facilmente manipulado, permanecendo inerente às decisões do governo romano.
Fazer qualquer tipo de associação entre os tempos do Império Romano e os dias atuais é demasiado perigoso, embora todo político deva ter assistido aulas de reforço em política do pão e circo. Afinal, para que ela surta o efeito desejado é preciso se adaptar os conceitos originais a realidade vivida. A crise que atormenta o casco das grandes potências mundiais e que parece ainda não ter aportado – pra valer – em terra brasilis deve trazer mudanças à ementa do curso. Haverá de se encontrar um jeito de manter a massa distante das ruas em sinal de protesto. E estes haverão de ser coibidos com violência. Praxe.
A lógica por mais redundante que seja é simples: barriga cheia, um teto para se guardar, um emprego que lhe sustente, e um pingo de diversão. Somam-se a isso os deveres do Estado para com saúde, segurança, educação e pronto. Infelizmente, o ser humano não foi lapidado a sentir necessidade de conhecer (ter “real conhecimento” sobre) o mundo que vive. Não é preciso compreender como a roda gira. Basta saber que ela gira e continuará girando. É piegas, mas é fato.
Ser palhaço não é mais exclusividade de poucos privilegiados e dotados de absoluta capacidade em fazer rir. O termo ganhou conotação pejorativa ao longo dos anos. Todo e qualquer um se transforma em “palhaço” com um estalar de dedos: a assinatura de importante medida; uma declaração feita em horário nobre e assim por diante. A profissão desgastou-se. Os grandes palhaços jazem esquecidos no subconsciente coletivo. Por fim nos tornamos os grandes palhaços da pós-modernidade. O público que assiste as atrocidades na terra batida do Coliseu e aplaude de pé as migalhas que chegam.
Mil vivas para Ronaldo Fenômeno.
Não há consenso na voz que eclode na multidão. Todos querem dizer alguma coisa e ao mesmo tempo. A ociosidade gerada pelo desemprego imbuiu nos americanos a vontade de possuírem seu próprio diário de bordo. A internet e os blogs fazem as honras da massa sedenta, faminta e angustiada nesses dias tão estranhos. Imagine se todos os romanos presentes em uma noite de entretenimento tivessem voz ativa para falarem o que bem quisessem. Seria a contemplação do caos. Pergunto: será isso o que nos reserva o dia de amanhã? Por essas e outras, o panis at circenses dos tempos da Roma antiga está – e continuará – nas entrelinhas de nossas vidas. Mesmo a contra gosto.
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Artigo publicado para a coluna "Ponto de Vista" do Jornal Classe A de Luis Eduardo Magalhães/BA, Edição nº127 de 14 de março
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