9 de mar. de 2009

O tal egoísmo


Sou defensor da tese do ser humano ser egoísta. Em doses extremadas, diga-se. Sem exceção. A culpa possivelmente é da história e não da natureza. As escrituras sagradas confirmam que quando da criação éramos puros e perfeitos. Rogo aos episódios subsequentes e cravados no seio dos séculos a lapidação daquilo que nos tornamos. Seres egoístas que na maioria das vezes nem se dão conta disso.

O medo nos faz assim. A insegurança de ir e vir e ter certeza que nossos bens continuam intocáveis. A cada dia, o homem demonstra similaridades com os instintos naturais dos animais irracionais: sobrevivência, defesa do território e claro, defesa da prole. A questão é que tais prerrogativas se tornaram mais evidentes com o desenrolar dos anos e os efeitos do processo histórico nas sociedades modernas.

Porém, esse processo todo só se fez possível com a direta participação do ser humano. Em suma: somos reflexo daquilo que nós mesmos construímos ao longo dos séculos. Uma versão simplificada da velha máxima do que se planta colhe. Ou seja, estamos colhendo os frutos plantados pelas gerações passadas. O egoísmo é uma conseqüência - não precisa de aceitação – mas está fincado no íntimo de cada homem e mulher deste planeta.

O sociólogo alemão Max Weber estudava o ser humano de forma individual. Seu objetivo era compreender o sentido que cada ator dá a sua conduta. Para ele antes da coletividade havia o uno, o individual, o que pertence a um único ser. Novamente o processo histórico: a concepção daquilo que somos está diretamente ligada a bagagem cultural que carregamos desde o nascimento e que acaba por contribuir na nossa conduta. Ponto.

Weber dizia: “O conhecimento é uma conquista que nunca chega ao fim”. Feitos de exclusividade individual. O conhecimento pode ser gerado para o todo, mas somente aqueles que tiverem interesse e vontade em aprender é que o terão. Fragmentado é verdade, mas ainda assim o terão. Porém o conhecimento não é sinal de superioridade. Ninguém é melhor que o outro por ter mais conhecimento. Entretanto, se considerar melhor que o outro por ter alguma coisa – ou não, a bem da verdade não é preciso ter nada para se considerar superior, ou melhor, que outra pessoa – se tornou algo natural e comum.

O pior é que não existe tempo para se perceber esse fenômeno. A vida nos dias de hoje nada mais é que uma superação de obstáculos. Pensar é verbo não conjugado. O ser humano ama tanto a si mesmo que só tem olhos e tempo para seu próprio umbigo. A proporção de direitos parece muito maior que a de deveres. O poder consome. Mutila a essência. Hitler é um exemplo de egoísmo. Fez dos seus interesses particulares, motivação para dizimar milhares de pessoas. A tal raça superior que sustentava não passava de uma justificativa para a barbárie que cometia.

Todavia, não é preciso ser um ditador para ser egoísta. Esta nas entrelinhas. Invisível. A fábula dos três mosqueteiros não passa de entretenimento. Seu jargão uma utopia. “Um por todos e todos por um”. Mentira. Balela. Uma tentativa frustrada de infiltrar uma mensagem no subconsciente das pessoas. Nem mesmo os livretos de auto-ajuda têm esse poder. São tão profícuos quanto às mensagens em power point de vida curta. O tal egoísmo do ser humano é imune. Não é preciso que se perceba, ou mesmo que se concorde. Tão pouco será preciso uma segunda lida neste artigo. Como disse: o tal egoísmo é imune.

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Artigo publicado para a coluna "Ponto de Vista" do Jornal Classe A de Luis Eduardo Magalhães/BA, Edição nº126 de 07 de março.

Um comentário:

Anônimo disse...

Sabe o que confirma o teu texto?
Quando conhecemos uma pessoa não-egoísta (sim, elas existem e até conheço UMA). O espanto é tanto ao conhecer esse ser estranho altruísta que, se olharmos - e analisarmos - todos os que estão ao nosso lado, veremos a triste realidade: sim, todos são egoístas. Ser humano é ser egoísta, infelizmente.

Tiago Medina