Foto: Wilton Junior / Agência Estado (mais fotos aqui) |
Chega a parecer mentira e até difícil de acreditar. No entanto e talvez como se camuflada nas vestes de uma brincadeira de extremo mau gosto, as tragédias que se noticiaram ao longo desta semana em decorrência da intensidade das chuvas, em especial no Rio de Janeiro (300 milímetros em 24h na terça-feira, 11), não são/eram mais novidade. Para ninguém. Repetem-se. Ano após ano, talvez, com a sutileza ou perversidade de serem a cada nova enxurrada um pouco mais graves. Com mais vítimas a se registrar e incluir nome e RG nas piores e mais desumanas estatísticas possíveis. No Rio passou de 500 o número de mortos; quanto aos desabrigadas chegou aos milhares.
A culpa, seria de uma leviandade desproporcional dizer que é exclusiva dos governos municipais, estaduais ou federal. Não é. Pelo menos destes governos. Eles têm sua parcela, mas não são de um todo culpados. A chuva cai por outras e inúmeras razões. É inevitável. E necessária, claro, quando vinda com menos agressividade a esta dos últimos verões. Em contrapartida, está chovendo mais, hoje em dia, do que há 20 ou 30 anos. Há mais calor também e a quentura, como todos sabem, ajuda na formação das nuvens carregadas com vapor de água. O aquecimento global, segundo dizem, não seria o motivo para tanta água vinda dos céus. O fenômeno “El Nino”, este sim, exerce forte influência na quantidade de chuva que vem castigando, praticamente, o Brasil todo, verão após verão.
Prefeitos, Governadores ou mesmo o (a) Presidente (a) da República não são dotados de poderes especiais capazes de impedir que a chuva despenque dos céus. Não podem negociar uma trégua com São Pedro, por exemplo. São, isto sim, cúmplices e coniventes, por realizarem pouco para evitar que novas tragédias ocorram e outras vidas sejam ceifadas de modo tão prematuro. São responsáveis pela “herança maldita” (não simpatizo do termo, mas não encontrei nada melhor) de governos lerdos e incompetentes de outrora. O que se colhe hoje, neste caso especificamente, é fruto de um plantio equivocado realizado no passado. Loteamentos em locais de risco. Crescimento exagerado dos grandes centros urbanos, entre outros.
Acontece, isto é fato, que quando uma tragédia como esta da região serrana do Rio de Janeiro ou aquela de Santa Catarina, no ano anterior, ocorrem, são acompanhadas por medidas meramente contemplativas. Não se ataca a raiz do problema. Talvez, possam alegar os mais incautos, não haver como se erradicar determinadas regiões do risco de alagamentos, deslizamentos, desabamentos e outros tantos “entos” de representatividade trágica. Faltaria recurso e local para colocar tanta gente. É um mal que vem de décadas atrás. Em muito, devido às vistas grossas e pouco planejamento em longo prazo de alguns governantes e empreiteiros do passado. Em São Paulo e outras capitais e cidades de maior envergadura, sempre que chove, há inundações, enchentes, acúmulo de lixo e entupimento de bueiros. É a mesma história sempre. Pessoas desesperadas tentando salvar mobília e a própria vida, igualmente ao que fizeram um ano ou dois anos antes.
Infelizmente, o início de um novo ano, o verão e todo oba-oba que envolve o momento estão se tornando sinônimo de uma rotina bizarra: de um lado; fortes chuvas, temporais, deslizamentos de terra, inundações, dezenas, até centenas de mortos; de outro: índices elevadíssimos de solidariedade, reforço no significado das máximas “ter esperança” e “recomeçar de novo”, ações isoladas e provisórias, por parte do poder público, para tampar os buracos causados pelos desastres. Há quem confie ainda que sejam sinais do fim dos tempos.
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O texto acima foi escrito na tarde de quarta-feira, 12 de janeiro, para a coluna que assino semanalmente no Jornal Classe A, de Luís Eduardo Magalhães. Com leves alterações ao original.
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