10 de jan. de 2011

A fotografia da tatuagem nas costas

A imagem é meramente ilustrativa e a tatuagem retratada no texto abaixo bem menor

Não era pra ter visto, mas vi. Tinha acabado de rever o belíssimo filme argentino O segredo de seus olhos. Grande filme. A segunda vez apenas comprovou o que já tinha sacado ao deixar o cinema, quase um ano antes. Pensava alto. Ria. Estava levemente feliz. Matutava sobre o surpreendente desfecho da película. - Ele só queria conversar. O condenado assassino só queria conversar.

Abri a geladeira para pegar água. Passavam dois minutos das vinte e duas. Tinha outro filme pra ver. Não queria perder tempo. Olhei pela janela do apartamento. Algumas luzes, pouca movimentação. Voltei meus olhos para baixo, para o prédio ao lado, menor dois andares que o meu. Uma janela estava aberta e a luz acesa. O piso de madeira me lembrou o do meu próprio apartamento. A cama estava feita, lençóis claros, a fronha do travesseiro tinha o desenho de uma rosa. O guarda-roupa era branco. Mal o via.

Ela estava sentada na cama mexericando uma câmera digital. A posicionou no parapeito. Vestia um vestido escuro com desenhos menores, talvez flores, talvez borboletas. Da posição que me encontrava pareceu impossível identificar o que eram. Minha única certeza é que eram coloridos. Nada mais. Descalça com os joelhos lisos a mostra ela devia ter saído do banho a pouco. Talvez tenha passado um daqueles cremes que as mulheres costumam usar depois que se banham.

O cabelo loiro com mechas castanhas estava quase seco. Ela não devia ter mais de 19 anos. Após alguns instantes procurando a melhor posição para a máquina, ela apertou o botão. Deu as costas para a câmara. Com a mão direita afastou o cabelo úmido. O pescoço nu, a pele branca como leite e uma tatuagem. Disparou o flash. De um salto ela pegou a máquina a fim de ver o resultado. Insatisfeita repetiu a operação.

Tive dúvidas sobre o desenho da tatuagem. Pareceu-me um beija-flor, mas podia ser uma rosa e até ter uma estrela, ou duas. Era uma daquelas tatuagens que estampam o corpo de nove entre dez mulheres tatuadas.

Após a segunda tentativa ela desistiu de fotografar a si mesma. Deitou. De onde estava, só conseguia ver a metade esquerda do seu corpo. O vestido escondia pouco. Tive a impressão que ela estava vendo as fotos armazenadas na máquina. Achei melhor não fazer movimentos bruscos, sob risco de ela perceber a minha intromissão. Estava invadindo sua intimidade. Entrando em seu quarto. Era um intruso.

Fiquei com vontade de ver o resultado. Compartilhar a foto da tatuagem, afinal, fui cúmplice do clique. De qualquer sorte, teria de esperar que ela a postasse em algum dos seus perfis na internet. Orkut, facebook, twitpic. Sei lá. Mas como? Não sei o nome dela. Talvez ela não quisesse conversar, ou me revelar algo tão particular, assim, numa conversa entre janelas. Desconhecidos. Achei melhor deixar de lado e voltar para meu filme. O segundo da noite. Talvez ela volte a se fotografar novamente. E eu, caso insista em tentar assistir as escondidas, estarei me revelando um baita de um "canalha curioso".


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