8 de fev. de 2009

Gaza e os números da violência no Brasil

Foto: O Globo Online


Uma das definições dos dicionários para a palavra guerra diz o seguinte: “Guerra, igual, atos de hostilidade entre pessoas ou famílias”. É o que acontece hoje em dia na faixa de Gaza, e é, justamente, o que já aconteceu em outros períodos da história da humanidade, em que o rancor, o egoísmo, o individualismo, o ódio, sobrepuseram-se ante a harmonia de se viver coletivamente manchando de forma irreversível a passagem do homem sobre a terra.

Entretanto, atos hostis não são exclusividade de uma guerra, como esta que massacra crianças visivelmente indefesas do outro lado do mundo. A hostilidade, tal qual a inimizade, a rixa e a oposição fazem parte do dia a dia de todo e qualquer conglomerado de pessoas ao redor do planeta. Independente, das motivações políticas, religiosas ou econômicas presentes em cada estilhaço de bomba de um conflito armado, como esse em Gaza, ou mesmo dos efeitos da falta de oportunidades na vida de moradores das periferias de países como o Brasil, por exemplo.

Estimativas recentes apontam que cerca de 10% do PIB brasileiro seja investido em segurança pública. Pouco, se considerarmos o crescimento proporcional da segurança privada e da indústria das armas. O fato é que nunca se fabricou tantos equipamentos letais, desde armas individuais e caseiras, até grandes equipamentos de artilharia terrestre, aérea e naval. E mais: nunca se viu tanta facilidade para se conseguir uma arma, independente dos meios para sua obtenção, como nos dias que vivemos. De fato, a indústria das armas parece não ser afetada pelos efeitos nocivos e devastadores da tão propalada crise econômica mundial.

Para se ter uma ideia, nos cinco primeiros dias úteis de 2009, 50 pessoas foram assassinadas na cidade de Salvador. Uma média de dez mortes violentas por dia, o dobro do registrado no mesmo período de 2008. A propósito, o Brasil é um dos líderes mundiais em homicídios. A taxa por 100 mil habitantes chega a 25,2. Entre os jovens, a taxa é ainda maior: 51,6 por 100 mil habitantes. Em suma, números que justificam a necessidade primária de segurança do ser humano, principalmente quando este se sente ameaçado e desprotegido.

A gratuidade da violência pode ser vista também nas estradas do país, onde, considerando-se os números absolutos é possível afirmar que existe uma guerra de espaço entre os milhares de veículos circulantes nas estradas e, também uma guerra para se chegar o mais rápido possível onde se deseja. O número de mortes nas estradas federais durante o feriado de fim de ano cresceu 13,3% em relação ao mesmo período de 2008. Atos de hostilidade, pura e simples. Excessos. Abusos. Irresponsabilidade.

Os números não mentem: de 20 de dezembro a 04 de janeiro, 435 pessoas morreram ao longo dos 61 mil quilômetros de rodovias federais em todo país. A título de comparação, no mesmo período o conflito no Oriente Médio matou o equivalente a 500 palestinos. Grosso modo, se somarmos os homicídios, mais os acidentes de trânsito, no período entre o final de 2008 e a primeira semana de 209, teremos no Brasil algo semelhante a três vezes o número de vítimas fatais em relação à Gaza.

Ora, a hostilidade descrita nos dicionários e presente na essência do ser humano demonstra ser irreversível. A violência, impulsionada pela espetacularização propagada pela imprensa de modo geral, infelizmente, parece ter se tornado algo comum no dia a dia de pequenas e grandes cidades. Gratuitamente, sem discussão, sem solução. Como se “Gaza” e suas demonstrações de barbárie fossem coisa de cinema e fizessem parte de um enredo distante. Basta. Incompreensão não é exclusividade dos povos de lá.


Artigo publicado para a coluna "Ponto de Vista" do Jornal Classe A de Luis Eduardo Magalhães/BA, Edição 120 de 24 de janeirode 2009.

Um comentário:

Unknown disse...

Muito bom o texto, gostei, mas faço um reparo: mulheres e crianças são usadas como escudos pelos Palestinos, num ato de covardia e irresponsabilidade.

Nós vivemos numa guerra civil e parece que ninguém quer ver.