Foto: Anton Roos
Não existe meio termo quando o assunto é cigarro. Ou se ama ou se odeia. A manutenção de um posicionamento neutro em relação ao assunto é de uma insensatez tamanha, uma vez que não existem meio fumantes. Ou o sujeito fuma, ou não.
Até o final do século 19 fumar cigarro era raridade. Para se ter uma ideia, em 1880, cerca de 58% dos usuários do tabaco eram mascadores de fumo, 38% fumavam charuto ou cachimbo, 3% cheiravam rapé é apenas 1% era fumante de cigarro. Graças a James A. Bonsack inventor de uma máquina capaz de enrolar 200 cigarros por minuto, a história mudou drasticamente, com o aparecimento da industrialização.
Quase 130 anos depois, a impressão que se tem é de cumplicidade em relação ao consumo. Apesar das restrições publicitárias, a indústria continua crescente e agregando novos usuários a cada novo amanhecer. A dependência e as dificuldades em se largar o vício continuam presentes como uma ferida incicatrizável.
O médico cancerologista Drauzio Varela explica: “a nicotina é um alcalóide. Fumada é absorvida rapidamente pelos pulmões, vai para o coração e, através do sangue arterial, se espalha pelo corpo e atinge o cérebro. No sistema nervoso central, age em receptores ligados as sensações de prazer. Esses, uma vez estimulados, comunicam-se com os circuitos de neurônios responsáveis pelo comportamento associado à busca do prazer. De todas as drogas conhecidas, é a que mais dependência química provoca. Vicia mais do que o álcool, cocaína, morfina e crack. E vicia depressa: de cada dez adolescentes que experimentam o cigarro quatro vezes, seis se tornam dependentes para o resto da vida”.
A principal ameaça às tentativas em se parar de fumar estão descritas no capítulo “Por que o cigarro conquistou o mundo”, do livro “O Cigarro” escrito por Mario César Carvalho: o prazer. Talvez o argumento mais abrasivo aos amantes do consumo e único capaz de explicar e fazer entender os efeitos da dependência química. Resumidamente: o fumante regozija de prazer ao consumir a droga.
A nicotina provoca uma interação imediata com alguns neurônios do cérebro associados às sensações de prazer e de recompensa. Basicamente a cada nova tragada a uma repetição do estímulo causador do prazer. O autor explica que “se um cigarro for consumido em dez tragadas, o cérebro do fumante de um maço por dia verá esse circuito repetir-se 73 mil vezes por ano”. Logo se pergunta: que outra droga provoca 73 mil impactos de prazer num ano? Valendo-se desta conclusão é possível entender porque o equivalente a 80% dos usuários que tentam largar o vício fracassam na tentativa de abandonar o cigarro.
O sorriso no rosto de um ex-fumante não tem preço. “Estou a um mês e meio sem fumar” disse um amigo dias atrás. Imagine as conquistas desta batalha uma a uma: após 24h sem fumar, o pulmão do individuo já começa a se limpar. Ele tosse; após 2 dias, o olfato e paladar melhoram, o ex-fumante percebe cheiros e sabores com mais facilidade; em 3 semanas é a respiração que agradece e 1 ano após o último e malfadado cigarro, os riscos de morte por infarto são diminuídas pela metade.
Por mais absurdo que pareça, é possível se argumentar tanto a favor quanto contra o consumo do cigarro. A decisão de se tornar ou não um fumante é individual e por isso construída sob um alicerce extremamente subjetivo. Fumantes de fim de semana são seres indefinidos. Mais dia menos dia terão de se posicionar contra ou a favor, tornando-se consumidores do produto ou contrários a prática. As razões para tal variam de pessoa para pessoa, sendo irrelevante aponta-las neste artigo. Via de regra, prefiro por livre arbítrio a ala dos não fumantes, hoje e sempre.
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Artigo publicado para a coluna "Ponto de Vista" do Jornal Classe A de Luis Eduardo Magalhães/BA, Edição nº124 de 21 de fevereiro.
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