5 de jul. de 2010

O dia que visitei os velhinhos - I

Foto: Anton Roos/agosto de 2007
Tenho total admiração para com os idosos. Uma vez, alguns anos atrás, tive a oportunidade de visitar-lhes, in loco, em local que dizem propício e chamado de lar. Na chegada fui recepcionado por uma simpática funcionária da casa e por dois velhinhos sentados no hall de entrada. Receptivos, ambos conversaram comigo e outra colega por alguns minutos. Um deles sofria com problemas visuais. Foram eles que nos convidaram a conhecer as dependências da casa.

Fundado em outubro de 1976, o Lar dos Idosos é mantido pela diocese de Barreiras e por contribuições feitas por benfeitores, principalmente europeus. A obra divide-se em dois blocos com dormitórios para os velhinhos. De um lado homens, de outro, mulheres. São quatro quartos em cada bloco de alojamentos com capacidade para três pessoas cada. A casa ainda possui sala de reuniões e enfermaria, na ala masculina, capela e quarto para descanso de funcionários e/ou visitantes na ala feminina. No centro encontra-se o hall de entrada para os visitantes, sala de televisão, refeitório e cozinha. Nos fundos, uma cobertura serve para os encontros entre os velhinhos e visitantes e para comemorações ocasionais: aniversários, festas juninas, Natal, etc. Arejado, o local, em dias de intenso calor, é um dos lugares mais refrescantes do terreno.

Ali nos deparamos com três senhoras. Elas cantavam. Paramos para ouvir. A mais gorda era também a mais dinâmica. Vaidosa, mantém o uso de brincos, anéis, pulseiras e diadema. Sã, ela reclamou da secura do clima, da queda das folhas secas das árvores e da falta de saúde para realização de algumas atividades básicas. “Ah, se tivesse força e saúde como esses jovens” comenta a vózinha vendo as folhas da mangueira espalhadas pelo chão. As outras duas eram irmãs. A mais franzina acabara de sofrer um derrame e precisava de cuidados especiais. A alimentação se dá pelo uso de sonda. Sem condições de, sozinha, cuidar da irmã enferma, a mais lúcida, mas também com problemas de saúde, teve de recorrer ao lar dos idosos.

Elas entoavam cânticos cristãos. Nossa presença no primeiro instante, pareceu não importunar o trio, que terminou a cantiga, antes de se pronunciar pela primeira vez. A irmã da velhinha que sofrera o derrame foi a primeira. “Ela adora cantar, estou tentando ensinar a ela algumas canções da igreja, mas ela prefere canções do mundo” disse. “Se deixar, ela passa horas cantarolando velhas marchinhas de carnaval”, continuou. Nostálgica, afirmou que sente falta do lirismo daquelas canções. Concordamos e o trio voltou a cantar.

Enquanto ouvíamos atentos ao segundo ato das “jovens” senhoras, a irmã Luciene, responsável pela manutenção da casa, apareceu. Passado os cumprimentos de praxe, começamos nossa conversa a respeito do trabalho desenvolvido no Lar. O papo durou aproximados 20 minutos. Tempo suficiente para descobrirmos algumas peculiaridades do trabalho desenvolvido e suplantado pela diocese, especificamente por Dom Ricardo.
 
Irmã Luciene, é técnica de enfermagem, e a época de nossa vista estava a sete anos a frente da administração da casa. Passou pela fase de transição até a reforma em 2003. Paciente e prestativa, irmã Luciene conta que a casa tem capacidade para 30 velhinhos, e que hoje atende pouco mais da metade desse número, devido algumas normas instituídas pela administração do Lar em conjunto com a Caritas Diocesanas a fim de evitar abusos quanto ao acolhimento de idosos pelo lar.

Tamanha foi nossa surpresa ao conhecer alguns procedimentos da casa. Ignorantes, chegamos lá cheios de pré-conceitos. Normalmente se conceitua um “asilo” como um local onde as pessoas deixam seus familiares idosos e muitas vezes não prestam assistência sequer para eles.

Segundo irmã Luciene, os velhinhos que moram no lar, atualmente estão lá justamente por não terem família. Percebe-se que parte dos idosos está lá por não ter onde ficar ou porque envelheceu distante dos familiares, ou ainda, por abandono. Em todos os casos, são raros os contatos com familiares.

Assim sendo, os velhinhos que dispõe dos benefícios da aposentadoria tem 30% dos seus vencimentos creditados para o Lar dos Idosos. Irmã Luciene nos confidenciou que muitos são os casos de idosos que chegam no lar repletos de dívidas. “Não temos condições de arcar com esses débitos, mas certamente que nenhum deles morrerá de fome aqui”, salientou.

Um comentário:

Ellen Rarden disse...

Adorei o texto, excelente a construção da narrativa!