13 de abr. de 2009

Novela das oito

Foto: Anton Roos
Assistir novelas nunca foi meu forte. Talvez pelo tempo escasso que disponho, e muito por não simpatizar com o modelo de dramaturgia da televisão brasileira. Algo irrestritamente pessoal. Particular. Assim, seria uma incongruência opinar ou comentar sobre os feitos de personagem A em dada telenovela. Eis o motivo de manter-me o máximo afastado desses temas. O foco é outro, embora o título deste artigo sugira associações.
Então, vejamos. Conversas de botequim são sempre ricas em pautas e temas. É como se lá lhe fosse conferida uma chance de mergulhar no imaginário popular e principalmente naquilo que aflige o populacho. Há bem poucos dias, numa dessas conversas, um tema me foi proposto. Confesso ter ficado tentado a escrever sobre, embora uma avalanche de eventos de natureza particular, por hora, impediram-me de dar vida aquele tema. Garanto: esta na lista.

Via de regra, observar é verbo dos mais conjugados por qualquer articulista que se preze. Muitas vezes, as entrelinhas ou mesmo as miudezas daquilo vivo ante nossos olhos é mais que suficiente para uma coluna e posteriormente para discussão e reflexão. Valendo-se do verbo em questão, deparei-me – novamente – com uma dessas oportunidades.

Toda vez que vejo um cidadão ou cidadã folhear as páginas deste jornal – e claro, de outros periódicos da região – sinto um fio de esperança me farfalhar o espírito. Por mais inocente que pareça, é como se ali houvesse leitores e propensos mantenedores da instituição jornal em atividade. A título de curiosidade em 2005 a edição impressa do jornal The Times era comprada por cerca de 700 mil pessoas, enquanto, 3,5 milhões de leitores já se debruçavam em frente a um computador para acessar a versão on line do tablóide. No mínimo, assustador, para não adentrar – na escassez destas linhas – em vias totalmente apocalípticas e pessimistas.

Porém, outra razão me aguçava a curiosidade naquela manhã de terça-feira. Em segundos poderia ver constatado o que de fato interessa a quem se propõe a folhear um jornal impresso em Luis Eduardo. A resposta: novelas. Claro, a dedução cá exposta é passível de discussão, e principalmente, cabível de comprovação científica. Entretanto, não vejo razão para não deflagrar o aparentemente óbvio. Dentre os assuntos que mais interessam e mexem com o imaginário das pessoas estão as telenovelas. Fato.
Independente de linha editorial, peguei alguns jornais em circulação na cidade e os li. Da primeira a última palavrinha. Constatei por A mais B que a leitura integral de um jornal da região dura em média 30 minutos. Meia hora. Pouco se comparado aos jornalões das grandes cidades. Então, não ler ou priorizar a página de entretenimento de um jornal dá vazão para outros pressupostos, espinhados em “achismos” e por isso pouco convincentes. Seria preciso um estudo de caso abrangente para que se obtivesse um resultado com mais consistência. No momento, não é o caso.
Entretanto, desconsiderar o poder das telenovelas, no sentido de infiltração no imaginário das pessoas é uma sandice. As tramas, a atuação dos atores, os cenários, tudo se completa de maneira a transportar os telespectadores para lugares nunca antes vistos ou imaginados. Projeta-se a si mesmo naquilo que é visto na televisão. Foge-se das amarras do laboro frenético do dia a dia. Deste mundo onde o tempo já não é mais tão facilmente controlado. Onde, a simples possibilidade do ócio criativo – proposto pelo italiano Domenico De Masi – transforma-se em uma utopia vaga e distante. “É no tempo livre que passamos a maior parte de nossos dias e é nele que devemos concentrar nossas potencialidades”. Nada contra a novela das oito, mas os jornais, revistas e livros agradeceriam – se pudessem – o esforço e o mínimo de tempo despendido para suas leituras.
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Artigo publicado para a coluna "Ponto de Vista" do Jornal Classe A de Luis Eduardo Magalhães/BA, Edição nº131 de 11 de abril

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