24 de ago. de 2012

Cinco segundos


Por mais absurdo que possa parecer, cinco segundos são suficientes para se dizimar o que virá a acontecer na sequência de uma vida. Essa fração mínima e quase desprezível de tempo é, sim, capaz de interromper sonhos, projetos e uma história a dois, fato que aconteceu comigo alguns anos atrás. Em cinco segundos, tomado pela mais estúpida das imbecilidades, praticamente dei fim àquilo que mais prezei até hoje e que nunca quis que terminasse. Errei e, tempos depois, paguei o preço por não ter escolhido as palavras certas num momento de fraqueza. Infelizmente, por não ser perfeito como talvez a pessoa do outro lado da linha acreditasse que fosse, deixei a pressão do meu dia a dia falar mais alto e acabei por jogar no lixo o que mais amei no mundo.
As palavras, quando mal colocadas, infelizmente tem esse poder. São capazes de mudar vidas num piscar de olhos e nos levam por caminhos diferentes àqueles que gostaríamos de ter trilhado. Quando me dei conta já era tarde e já havia falado aquela que possivelmente será a maior bobagem já dita por mim à outra pessoa. Tanto, que o arrependimento que me socou o estômago cinco segundos depois de ter o telefone desligado de nada valeu. Não tive chance para reverter os cinco segundos de imbecilidade de pouco antes. Simplesmente tive de engolir em seco e aprender com as asperezas da vida a ser mais comedido na hora de administrar as palavras, principalmente com relação a quem mais se ama. 

Também não sei o que teria acontecido caso não tivesse respondido da maneira grosseira com que respondi naquele início de noite. Isso, a bem da verdade, pouco importa passados alguns anos daquele fatídico telefonema. O que vale é o aprendizado que se seguiu, e quanto a isso, não me restam dúvidas: foram muitos para ambas as partes. É como diz o ditado: a única certeza que temos – além, óbvio, da morte – é que o futuro é incerto. Não teria graça nenhuma se soubéssemos o que aconteceria com nossas vidas e tudo que sonhamos se tornasse real sem um pingo sequer de dificuldade ou barreiras para superar.

Os meus cinco segundos de apagão me levaram para outros caminhos.  Aliás, qualquer pessoa que venha a ter os seus cinco segundos de apagão verá sua vida mudar. É inevitável. O que me resta é admitir e ter sempre em mente, que tudo que fazemos, mesmo nos casos em que admitimos erros, são importantes para determinar o que nos acontecerá nos dias, meses e anos seguintes. Eu por exemplo, sei que errei e talvez vá conviver com esse fantasma pelo resto da vida. O que não quero é repetir um novo cinco segundos de imbecilidade, pois existem casos em que não nós é permitido uma segunda ou terceira chance para fazer melhor e não cometer erros infantis como o que cometi.

Charles Bukowski
Mas afinal, qual a lição disso tudo? Simples. A vida é curta demais para deixarmos que um fantasma do passado ou as consequências daqueles malditos cinco segundos de bobagem te ceifem o direito de ser feliz. O mundo dá voltas e depois de cada dia existe outro, com novas oportunidades e chances para recomeçar, seja onde ou com quem for. Parafraseando o mais safado dos gênios da literatura americana, Charles Bukowski. "O amor é uma espécie de preconceito. A gente ama o que precisa, ama o que faz sentir bem, ama o que é conveniente. Como pode dizer que ama uma pessoa quando há dez mil outras no mundo que você amaria mais se conhecesse? Mas a gente nunca conhece". É uma lógica que por ser assim tão lógica, muitas vezes não nos permite fazer o óbvio: viver sem culpa e conhecer algumas dessas dez mil pessoas, ainda que, uma só já fosse suficiente.

Por ora, talvez o que eu mais quero e anseio é ter a chance de saber se caso não tivesse sido tão imbecil naqueles cinco segundos, não teria tido mesmo oportunidade de ser feliz com quem mais amei nessa vida. Eu não sei e justamente por não saber é que fico mais tentado a não jogar a tolha mesmo que todos, inclusive o velho Buk, me cuspam na cara que aqueles cinco segundos de imbecilidade foram suficientes para mudar o foco. Repito: não sei. O que mais quero e aconselho é viver cada dia sem ter certeza do que a vida irá me proporcionar. O que é meu ou seu, ninguém tira, a não ser você mesmo, ou até que as perguntas tenham resposta, pessoas diferentes apareçam ou simplesmente o tempo passe.



19 de ago. de 2012

Nunca quis ser como Aurélio Miguel


O judoca Aurélio Miguel, único ouro nos jogos de Seoul,
em foto de Gil Pineiro/Manchete

Nunca em todos os anos de colegial tive qualquer aspiração em disputar uma Olímpiadas. Também, nunca houve qualquer tipo de incentivo na escola ou dentro de casa pra isso. Ainda não há. As crianças em idade escolar e em tempo de serem iniciadas esportivamente não recebem nenhum incentivo para tal. A culpa, arrisco afirmar, não é das aulas de educação física. É da falta de estrutura, afinal,não temos uma política adequada de incentivo à prática esportiva dentro do ambiente escolar.

Em 1988, era um meninote de nove anos quando Aurélio Miguel sagrou-se campeão olímpico no judô. Mesmo assim, nunca tive chance de conhecer o esporte e tentar, impulsionado pela febre dourada do judoca brasileiro, praticá-lo. Minha maior lembrança dos jogos de Seoul, embora tenha visto o momento do ippon consagrador de Miguel, foi a derrota do time brasileiro de futebol para a extinta União Soviética na final olímpica.

Lembro como se fosse hoje: a primeira coisa que fiz ao final da prorrogação que nos valeu a prata foi sair à rua com minha bola debaixo do braço e me imaginar um craque do esporte bretão tabelando com as paredes de casa para depois usar o portão da garagem como gol. O fato é que nunca quis ser como Aurélio Miguel. A escola que estudei, mesmo sendo particular, jamais proporcionou a qualquer um de seus alunos suporte para a prática de esportes que não os coletivos. O máximo de recordação que tenho de outras experiências esportivas nas duas horinhas semanais de educação física são esporádicas manhãs tentando saltar por sobre uma fita elástica amarrada em duas hastes de ferro, em simulação ao salto em altura, e parcas corridas em simulações de salto em distância e salto triplo.

O detalhe é que mesmo assim, sem um mínimo de estrutura. Saltávamos sem vestimentas adequadas. Sem tempo para um aquecimento mínimo e sem nenhuma condição de almejar dar seguimento a uma carreira no atletismo. Óbvio que o fato de estarmos em uma cidadezinha do interior, distante mais de 500 km da capital gaúcha exercia um peso negativo ante a vil possibilidade de um de nós sonhar praticar um esporte alternativo de maneira profissional. Aliás, isso praticamente inexiste no país.

As aulas de educação física sempre foram vistas com desdém. Não era preciso esforço para obter uma nota que nos garantisse aprovação no final do ano. Responder a chamada, correr em volta da quadra coberta por duas ou três vezes e estar presente, mesmo que inutilmente, as atividades propostas pelo saudoso professor Cléver, eram o bastante. Não éramos incentivados a gostar do esporte. A levar o esporte a sério. Era tudo brincadeira. Sempre foi assim. (Nota deste colunista (blogueiro vez ou outra): Nosso mestre, eterno em nossos corações, é bom que se diga, jamais teve culpa nisso. Era um batalhador. Lutava com as armas que tinha, com os mínimos recursos que possuía e nós – os meninos – o tínhamos como um ídolo*).

O esporte no Brasil é levado na brincadeira. A cada ciclo olímpico renovam-se esperanças do país se tornar uma potência no quadro de medalhas, mas sempre, o número de ouros, pratas e bronzes é inexpressivo e muito pouco diante das dimensões continentais que possuímos. A maioria dos atletas que vão aos jogos, mesmo os anônimos, são heróis pelo simples fato de estarem lá. Sem estrutura, incentivo, material e em muitos casos, condições adversas e precárias de treino, ainda assim, conseguem índice para representar o país nos jogos. Os resultados abaixo do resto do mundo não são culpa deles, mas sim, da maneira amadora como a maioria dos esportes é tratado em terra brasilis.

O velódromo construído para o Pan do Riode Janeiro em 2007 é um exemplo crasso da incompetência e total amadorismo degerência esportiva. O complexo foi construído sem obedecer os padrões olímpicos e hoje, cinco anos depois, está defasado e não serve para abrigar os jogos do Rio em 2016. A pista recebeu investimentos federais e municipais – uma bagatela de R$ 14 milhões – para conseguir sediar as competições latinas, inclusive o piso foi feito de pinho siberiano tratado na Holanda. O que intriga é que razão faz com que se construa uma obra como essa se ela não pode ser aproveitada no futuro e agora, parece até imprópria para o incentivo da prática do esporte a crianças e jovens brasileiros.

Burrice? Malandragem? Desrespeito com o erário público? Em tempo, o risco de o velódromo ser demolido é gigantesco. Independente de qual seja a resposta, a esperança é que as crianças e jovens de hoje consigam fazer do exemplo vitorioso de Sarah Menezes e Arthur Zanetti, um incentivo para a prática esportiva e nossos políticos, tenham a hombridade de evitar os discursos chinfrins de sempre para colocar em prática, políticas de incentivo ao esporte nas escolas o quanto antes. O Brasil como um todo agradece. Esporte nas escolas é sinônimo de qualidade de vida, e desenvolvimento social. As medalhas serão conseqüência. Natural.


* O professor Cléver morreu no último ano do segundo grau, deixando uma legião de alunos e admiradores órfãos de seus ensinamentos, dicas, e parceria.



18 de ago. de 2012

Me abraça



Me abraça, disse ela, virando o rosto para o meu e entrelaçando as pernas nas minhas. A escuridão da noite era bela. As estrelas pareciam se exibir como se soubessem da nossa presença ali, deitados, sozinhos. 

Se tivesse planejado não teria sido tão especial como foi. Nos minutos que se passaram, nada parecia importar. Por um tempo ficamos deitados na areia, como dois amantes/amigos, contemplando o show que vinha dos céus, falando de constelações, galáxias e extraterrestres. 

A bem da verdade, enquanto ela falava e gesticulava minha mente estava longe, talvez procurando alguma explicação. Alguma razão para tudo que acontecerá durante todo o dia.

Os minutos que passamos abraçados, deitados na areia e abençoados apenas pelo brilho das estrelas no céu pareceram infinitos. Não haviam fantasmas do passado a nos atormentar. Pessoas, quaisquer que sejam a opinar sobre nós dois. Sobre o que é certo ou errado. 

Apenas nós

Como sempre quis que fosse, mas, pelos desencontros e circunstâncias da vida, nunca foi. Até aquele momento. Tão nosso e de mais ninguém. 

A respiração dela junto a minha era algo que a muito tinha vontade de sentir. Respondi ao seu pedido com o melhor abraço possível, pois no fundo, o que mais queria era que o abraço representasse o grito de quem não quer deixar escapar a quem se ama. Não de novo. 

Quando dirigia pelo trajeto de volta senti seus dedos me acariciando os cabelos. Tive vontade de parar. 

De gritar. 

De me jogar nos braços dela e esquecer que o amanhã pode não nos oportunizar uma nova chance. Talvez ela tenha razão e a culpa de tudo aquilo tenha sido do brinde que fiz horas antes na mesa do bar. 

“À vida que nos deu uma nova chance de estarmos próximos um do outro”

Não me arrependo. O dia seguinte pode parecer o mais incerto, sem direção, rumo, ou esperança de que o abraço, as estrelas e o carinho possam se repetir, mas ainda assim, é preciso vive-lo para saber se um dia vou ouvir ela me pedir novamente: me abraça.