7 de out. de 2010

O Brasil não se leva a sério



Ainda no domingo, 3 de outubro, um comentarista da Rede Bandeirantes de Televisão dizia que a campanha para as eleições deste ano foram insossas, tendo nos principais candidatos ao Planalto uma demasiada cautela em relação a apresentar propostas que façam jus as necessidades deste país varonil. 

De fato, a exceção de Plínio, o que se viu no fajuto período de propaganda, em especial na dos dois principais nomes para suceder Lula, foi uma quase que total imersão na mediocridade. Um mergulho profundo na falta de bom senso, tanto de políticos quanto de eleitores como um todo. Os primeiros, movidos pelo desespero de encontrar – ou reencontrar – o poder. Os demais, pela descrença ou mesmo pela falta de discernimento para operar mudanças significativas nos âmbitos municipal, estadual ou federal.

A política no país é um verdadeiro circo. Em linhas gerais, o Brasil não se leva a sério. A esmagadora eleição de um palhaço para representar São Paulo no congresso nacional se assemelha as caricatas bobagens que, nos seus primórdios o programa global Casseta e Planeta fazia em época de eleição (e talvez ainda o faça, embora com bem menos qualidade e originalidade) e é um exemplo crasso de como o brasileiro encara a política. A bem da verdade, Tiririca é uma mentira. Um tipo de piada que se conta no horário considerado nobre da televisão brasileira para manter o povo à margem e pregado na rotina estafante de trabalho – muitas vezes, quase escravo –, feijão com arroz, novela e cama. Um horário em que, infelizmente, impera a espetacularização do ridículo com apresentadores que se travestem de mongóis. Empurra-se, literalmente, com a barriga. 24h por dia. E assim seguimos.

O candidato é o personagem Tiririca ou o cidadão que atende por Francisco Everardo Oliveira Silva?

Tiririca, que na verdade é um personagem criado e mantido pelo humorista Francisco Everardo Oliveira Silva, fez 1.353.820 votos, representando um partido em ascensão, o Partido da República (PR) e que, curiosamente é detentor de correligionários em centenas de prefeituras em todo país, Luís Eduardo e Barreiras entre eles. No entanto, o que intriga é como um partido que se diz em prol da república aceita a filiação de um palhaço? Também este não se leva a sério? Apostou na dúvida entre o fracasso e o sucesso de uma candidatura dúbia para pensar nas consequencias somente após as eleições? Ou, está simplesmente esperando o momento certo para esclarecer a todos que tudo não passou de uma brincadeira?

De acordo com reportagem do jornal Correio Braziliense, publicada na quarta-feira, 6 de outubro, Tiririca tem uma semana, até 13 de outubro para provar que é o dono da caligrafia escrita no documento que pede o registro de candidatura protocolado no Tribunal Regional Eleitoral paulista (TRE-SP). Em miúdos, se for provado que o documento foi manuscrito por terceiros, o palhaço terá a candidatura impugnada e não será diplomado. Será? Na mesma reportagem, curiosamente, uma educadora avalia a situação sob outra ótica, a dos direitos políticos. “Nós lutamos anos para que os analfabetos pudessem votar. Por que eles não podem também ser eleitos?”, indaga. Boa pergunta e que merece cuidadosa reflexão.

Em contrapartida, na sempre bem humorada coluna que mantém no jornal O Estado de São Paulo, o jornalista Tutty Vasques coloca mais lenha na fogueira. “Não é justo que se cobrem bons antecedentes do Maluf e se mantenha impune o sujeito que votou, por exemplo, no Tiririca. Fosse ele penalizado quando elegeu o Enéas, o Pitta, o Collor ou o Jânio, já teria parado com essa palhaçada”, escreve Vasques. O colunista faz ainda uma analogia com o famigerado projeto de lei “Ficha Limpa” (praticamente estancado na incoerência dos magistrados do supremo), taxando os eleitores deste tipo de candidato (“tiriricas, “mulher-melão”, “casal roriz” e outros) como “eleitor ficha suja”. “O gaiato analfabeto que agora estão mandando para o Congresso pode até ser cassado, mas outros virão em seu lugar se a brincadeira de mau gosto não for cortada pela raiz”. E mais: “O bafômetro em boca de urna também ajudaria a evitar novos desastres provocados pelo voto-bêbado que elegeu uns e outros país afora”. Reflitam, reflitam.

Por fim e quase que ciente que não há mais esperança, reproduzo parte de um e-mail recebido esta semana e que, grosso modo, ajuda a entender os tantos porquês de eleição após eleição continuarmos reclamando das mesmas coisas e ainda assim nada mudar. O brasileiro saqueia cargas de veículos acidentados nas estradas; estaciona nas calçadas, muitas vezes debaixo de placas proibitivas; suborna ou tenta subornar quando é pego cometendo infração; troca voto por qualquer coisa: areia, cimento, tijolo, e até dentadura; fala no celular enquanto dirige; dirige após consumir bebida alcoólica; fura filas  nos bancos, utilizando-se das mais esfarrapadas desculpas; espalha mesas, churrasqueira nas calçadas; faz  " gato "  de luz, de água e de tv a cabo, Compra produtos pirata com a plena consciência de que são pirata e ainda quer que algo mude na política que ele mesmo ajuda a construir.

Eu avisei. Ta lá no segundo parágrafo: o Brasil não se leva a sério.




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Texto escrito para a coluna Ponto de Vista do Jornal Classe A de Luís Eduardo Magalhães/BA

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